Poema para a Feira do Livro (por João Cabral de Melo Neto)

Para Ángel Crespo “Folheada, a folha de um livro retoma o lânguido vegetal de folha folha, e um livro se folheia ou se desfolha como sob o vento a árvore que o doa; folheada, a folha de um livro repete fricativas e labiais de ventos antigos, e nada finge vento em folha de árvore melhor…

Dia do Trabalho com Drummond: Elegia 1938

Não somente em homenagem aos oito operários enforcados em Chicago (saudados anualmente por todo o mundo nesse primeiro de maio), mas em cumplicidade a todos os demais sufocados pelo tédio da vida que se apega em nós oleosamente como gordura a empapar nossa alma, publico uma das Elegias Drummondianas. No miolo de sua obra imensa,…

A Incapacidade de Ser Verdadeiro (por Carlos Drummond)

“Paulo tinha fama de mentiroso. Um dia chegou em casa dizendo que vira no campo dois dragões da independência cuspindo fogo e lendo fotonovelas. A mãe botou-o de castigo, mas na semana seguinte ele veio contando que caíra no pátio da escola um pedaço de lua. Desta vez Paulo não só ficou sem sobremesa, como foi…

Escricantores: James Joyce no Sertão de Guimarães Rosa

Emito aqui uma promissória para meus leitores: trazer a este blog algo sobre a relação entre James Joyce e Guimarães Rosa. Abro, entretanto, vosso apetite (que espero ser voraz) com dois fragmentos de O Burrinho Pedrês, texto de Sagarana, do nosso profeta mineiro e um de James Joyce. Todos bem expressivos do estilo que sustenta…

Revisitando Gainsbourg

(…) O filme é tecnicamente perfeito e extremamente oportuno para o triste momento em que vivemos enquanto espécie. Refletir sobre Serge e os imperativos morais que impedem a apreciação de sua obra traça uma triste imagem de nosso caricato momento. Pensar que artistas como Serge Gainsbourg e Vinicius de Moraes, donos de duas obras lisérgicas…

O Silêncio dos Espíritos

Não à toa o Rei Macbeth ao expressar o seu enfado da vida e o desprezo pelo Tempo caracteriza o que vê como um teatro de palhaços agonizantes cheio de “sound and fury”. Som e fúria. Outras duas palavras quaisquer não descreveriam melhor este tempo confuso e turbulento ao qual nos toca atravessar. Na contramarcha…

Hotel Toffolo (por Carlos Drummond)

“E vieram dizer-nos que não havia jantar. Como se não houvesse outras fomes e outros alimentos. Como se a cidade não nos servisse o seu pão de nuvens. Não, hoteleiro, nosso repasto é interior e só pretendemos a mesa. Comeríamos a mesa, se no-lo ordenassem as Escrituras. Tudo se come, tudo se comunica, tudo, no…

Oração de Fazer Poeta

Meu caro Santo Drummond Bandeira de São Manuel, Carente está meu papel D’um verso denso e bom. Com métrica, rima e som Mandai-me do último céu, Um verso talhado a cinzel Oh Santos da letra do dom. Se a Moderna prece é centelha Guimarães santo não nega A quem do Sertão se ajoelha Valei-me oh…

Palhaço (executado por Baden Powell)

“Sei que é doloroso um palhaço Se afastar do palco por alguém Volta, que a plateia te reclama Sei que choras palhaço Por alguém que não lhe ama. Enxuga os olhos E me dá um abraço Não te esqueças Que és um palhaço Faça a plateia gargalhar Um palhaço não deve chorar.” (Música de Oswaldo…

A Revolução dos Idiotas (por Nelson Rodrigues)

“As épocas são mais inteligentes ou menos inteligentes. Mais sóbrias ou menos nobres, românticas ou cínicas, perversas ou heróicas, etc. etc. Nos coube por fatalidade uma das épocas débeis mentais e das mais espantosas da história. Há uma debilidade mental difusa, volatizada, atmosférica. Nós a respiramos. Isso aqui e em todos os idiomas. É um…