Carta 36 (de Fernando Pessoa a Ophélia de Queiroz)

Ophelinha, Agradeço a sua carta. Ela trouxe-me pena e alívio ao mesmo tempo. Pena, porque estas coisas fazem sempre pena; alívio, porque, na verdade, a única solução é essa – o não prolongarmos mais uma situação que não tem já a justificação do amor, nem de uma parte nem de outra. Da minha, ao menos,…

Vinte e cinco anos depois, vinte e cinco vivas a “Os Mortos”

Os Vivos e os Mortos (The Dead, 1987) é um filme extraordinário de um diretor excepcional. Foi dirigido pelo americano John Huston, nascido na pacata Nevada de 1906, há exatos 25 anos, tendo envelhecido muito bem (ambos, aliás, criatura e criador). Autor de um percurso oscilante, sua sensibilidade e grandiosidade ficaram incrustadas em pedra, imunes…

Soneto Inglês n° 1 (por Manuel Bandeira)

“Quando a morte cerrar meus olhos duros – Duros de tantos vãos padecimentos, Que pensarão teus peitos imaturos Da minha dor de todos os momentos? Vejo-te agora alheia, e tão distante: Mais que distante – isenta. E bem prevejo, Desde já bem prevejo o exato instante Em que de outro será não teu desejo, Que…

Já que dura tão pouco a flor dos anos…

“Já Marília cruel, me não maltrata saber que usas comigo de cautelas, qu’inda te espero ver por causa delas, arrependida de ter sido ingrata Com o tempo, que tudo desbarata, teus olhos deixarão de ser estrelas; verás murchar no rosto as faces belas e as tranças d´oiro converter-se em prata. Pois se sabes que a…

Janelas Abertas

“Se acaso, por um momento, teu coração, como o de teu pai, ficar vazio, arruma a casa, abre a janela, põe tua roupa nova — para que o vento a caminho, mais uma vez, te arrebate vivo.”  

O Terceiro Frio da Rússia

“- Te levo comigo”, disse Ribamar sob o frio implacável do inverno moscovita. Nevava fortemente sobre a capital e sob os enamorados se avolumava um pesado e branco manto de uma transparência alva que, em verdade, os iria enlutar. A lua alta era uma sentinela de olho vigilante a interrogar-se sobre o desfecho de tal…

Poeminha Sentimental (por Mario Quintana)

“O meu amor, o meu amor, Maria É como um fio telegráfico da estrada Aonde vêm pousar as andorinhas… De vez em quando chega uma E canta (Não sei se as andorinhas cantam, mas vá lá!) Canta e vai-se embora Outra, nem isso, Mal chega, vai-se embora. A última que passou Limitou-se a fazer cocô…

Porquinho-da-Índia (por Manuel Bandeira)

“Quando eu tinha seis anos Ganhei um porquinho-da-índia. Que dor de coração eu tinha Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão! Levava ele pra sala Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos, Ele não se importava: Queria era estar debaixo do fogão. Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas… – O meu porquinho-da-índia…

aMuro

  “Entre l’homme et la femme, Il y a l’amour. Entre l’homme et l’amour, Il y a un monde. Entre l’homme et le monde, Il y a un mur.” (Versão de Jacques Lacan, encontrada no seminário “O Saber do Psicanalista”, para o poema de Antoine Tudal. Lacan aperfeiçoa a fórmula e aprofunda o enigma permutando…

Necrológio dos Desiludidos do Amor (por Drummond)

“Os desiludidos do amor estão desfechando tiros no peito. Do meu quarto ouço a fuzilaria. As amadas torcem-se de gozo. Oh quanta matéria para os jornais. Desiludidos mas fotografados, escreveram cartas explicativas, tomaram todas as providências para o remorso das amadas. Pum pum pum adeus, enjoada. Eu vou, tu ficas, mas nos veremos seja no…