Carta a um amigo enfermo

Queridíssimo amigo,

Sua mensagem me enche de alívio pelo que comporta de auspiciosa quanto ao afastamento do que (me parece) de mais grave poderia implicar em um diagnóstico. Afastada a tumoração, entendo que muito provavelmente o outro diagnóstico (qualquer que seja) será tratável e curável. Tenho plena certeza (e sei que falo pela boca de todos os anjos) que você em breve acrescentará essa situação à conta dos desafios superados.

O mundo precisa de você meu amigo. Em que pese não sermos eternos e não ser atitude própria uma ligação demasiadamente aferrada à vida, sua existência (mesmo que insistida, como propõe João Cabral) de alguma maneira corrige em parte uma ordem de torção que diariamente nos é imposta goela abaixo. É justamente numa época em que gerânios são obrigados a florescer em armários fechados (para citar uma expressão de Drummond) que um espírito livre e racional como o seu reluz coruscante em uma época de trevas.

Sua luta atual soma-se não somente às demais por você já travada, mas a todas as grandes quedas e reascensões da história. Lutando bravamente como lutas, você é, a um só tempo, Ulisses retornando a Ítaca, Calaf esperando pacientemente o fim da noite que lhe traria o amor, Papageno aceitando a amplidão dos limites de seu comércio de pássaros, Riobaldo Tatarana derrotando a bala todo o bando de Joca Ramiro e tornando-se Urutu Branco, Santiago retornando à sua casa após pescado o seu espadarte. Seu feito soma dignidade e heroísmo a um tempo sem qualidades.

Receba o abraço afetuoso de quem o ama como um familiar e quer estar próximo neste seu momento.

Pedro Gabriel

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